sábado, 24 de abril de 2010

Talca, 24 de Abril de 2010
















Os problemas vão sendo ultrapassados, sucedendo-se rotinas de uma forma que vai ganhando alguma naturalidade. É desta forma que o lagar está evoluindo, as diferentes pessoas vão tomando conhecimento das suas funções e lentamente vão sendo capazes de as executar. No entanto, falta a compreensão daquilo que fazem, para não agirem como se fossem mais um equipamento do processo, esta parte, apenas se atingirá com a experiência, vai levar tempo e vai depender da dedicação e interesse de cada um. A extracção de azeite, para além da técnica e experiência, resume-se a concentração e vigilância, quando isso não acontece ocorrem falhas e de seguida problemas. É importante que se perceba, que em vinte minutos se ensina uma pessoa a carregar nos botões certos, de forma a que entre azeitona por um lado e saia azeite pelo outro, é o mais fácil que existe num lagar. Obter qualidade, muitas das vezes surge de um modo empírico, não científico e para se descobrir o caminho é necessário muita dedicação, gosto pela actividade e uma busca constante de conhecimento. Serve parte deste texto para introduzir um comentário que foi feito aqui no blog, no artigo anterior, que me despertou a atenção e que sem dúvida apreciei, que passo a transcrever.

Anónimo disse...
Caro amigo,Pelo que vou lendo, parece-me que já não queres voltar!...Boa estadia e espalha o "perfume" mas não deixes a receita. Abraço.

Estas palavras fizeram-me pensar se de alguma forma posso estar a passar uma mensagem diferente daquela que pretendo. Criei este blog para relatar uma experiência, que confesso está a ser a melhor que alguma vez vivi a nível profissional e em tom de piada, devo dizer que ainda por cima me pagam. E digo agora, que pagaria bem para ter o previlégio de a viver. Pode ser que por estar a ser tão aliciante, esteja um pouco eufórico com tudo aquilo que me rodeia e corra o risco de não conseguir transmitir aquilo que pretendo, quando escrevo estas linhas, de madrugada antes de dormir, cansado do dia e a revirar os olhos, cheio de sono. Hoje, resolvi falar um pouco mais dos meus motivos, objectivos e também opiniões, apesar de como já disse, não ser essa a ideia e tão pouco é aquilo que me agrada mais fazer.

Como profissional, tenho o dever e a necessidade de fazer um bom trabalho, de forma a não defraudar pessoas que a 11000km de distância, acreditaram que de alguma forma, um português que nunca tinham visto na vida, os poderia ajudar. Pela lógica das coisas e pelas noções globais, a escolha deveria ter sido, pela seguinte ordem, um italiano, depois um espanhol, a seguir um grego e lá para o final um português. Sem falsas modéstias, orgulha-me a escolha, mas não me envaidece, traz-me responsabilidade acrescida. Quando aceitei vir, tive sempre isso muito presente, e por isso, resta-me dar o meu melhor, como profissional, representando uma empresa, para que no final, não existam grandes arrependimentos de parte a parte, acreditando neste momento, que não haverá lugar para esse tipo de sentimentos.

Como pessoa ligada aos negócios, aquilo que vejo á minha volta não me passa ao lado, e as oportunidades aqui são muitas e nesta era global que vivemos, temos todos que procurar que a nossa visão alcance para além da nossa casa. E esta poderá ser também uma forma de exportação, para as empresas portuguesas, não exportar apenas produtos, mas também outro tipo de serviços. Quantas acessorias espanholas temos a operar no nosso país na área do olival? É apenas mais uma forma de gerar receitas, de dar músculo a uma empresa. É também, e muito mais importante que aquilo que falei anteriormente, uma maneira que se diga o nome Portugal pelo mundo fora, porque infelizmente, aqui e em demasiados países, o cidadão comum, desconhece que no nosso país se produz azeite. A semana passada uma empresa portuguesa, vendeu para aqui um software informático específico para lagares e esta gente ficou de boca aberta com as potencialidades dessa aplicação, criada por um português. A seguir venderá a outros lagares chilenos, seguramente. Para a semana, uma empresa prestadora de serviços portuguesa, vem cá, porque afinal faltam máquinas de colheita de olival superintensivo e para o ano, provávelmente em vez de colher azeitona apenas dois meses em Portugal, colherá mais dois meses aqui no Chile. É útil a cooperação entre empresas, tive aqui uma grande lição a esse respeito. Há centenas de anos que esta cultura agrícola faz parte das nossas vidas e incomoda-me verdadeiramente que um americano saiba que se produz azeite no Chile ou na Argentina e desconheça que se produz azeite em Portugal há muitos séculos. Alguém no nosso país terá que saber e responder porque acontece isto. Os meus conhecimentos e limitações académicas, não permitem que eu me atreva a dar as respostas, pelo menos em público. Hoje pela manhã o gerente da empresa Olivares de Quepu perguntou-me: Alberto, porque não se ouve falar de Portugal relativamente ao azeite e afinal é um país que tem fronteira com Espanha? Apenas consegui encolher os ombros, e disfarçar o melhor que pude a vergonha que senti.

O mais importante, é que nós e outros países tradicionalmente produtores de azeite, percebamos e olhemos bem de frente para os novos concorrentes que temos. A informação não se pode esconder hoje em dia, não vale a pena. A tecnologia, está disponível e ao alcance de todos, basta encomendar e pagar. Existem centenas de livros e artigos, onde se "ensina" como extrair azeite de qualidade, seja de costas, a fazer o pino, como quisermos. Resta-nos o conforto temporário de que, estas coisas não se aprendem apenas com os ouvidos e os olhos, é preciso um pouco mais que isso e ainda por cima leva tempo. O que hoje em dia pode marcar a diferença é acima de tudo o factor humano, que é uma das vantagens de que podemos beneficiar, porque nós temos a história, a cultura, o ritual, a experiência desta actividade. A idéia de que o nosso azeite é bom e o dos outros não presta, já não faz passar a mensagem, foi chão que já deu uvas. Apenas serve para nos ir animando enquanto enterramos a cabeça na areia, para que possamos estar um pouco mais de tempo sem enfrentar a realidade que mais cedo ou mais tarde nos cairá em cima. Poderemos então escrever mais um fado e continuarmos teimosamente a defender meia dúzia de litros de azeite de cada um. Forçosamente teremos que mudar um problema grave que nos afecta, que é acima de tudo de mentalidade, uma mentalidade que nos faz sermos cada vez mais pequenos. A verdade, é que efectivamente, através de um esforço contínuo, Portugal poderá ter (e vai tendo) azeites ao nível dos melhores que existem no mundo. Agora, entendo que, não podemos fingir que não existem chilenos, argentinos, americanos, australianos e outros... Muito menos os podemos menosprezar, seria um grave erro, talvez irreversível. Por isso, a minha pequena contribuição é, tão sómente descrever, de uma forma honesta aquilo que vou observando por aqui, e na verdade, existe muita qualidade e um grande potencial de evolução qualitativa e também produtiva.

Torna-se necessário, para não sermos ultrapassados por esta gente, que melhoremos ainda mais, em pontos chave, como a comercialização, a promoção, a qualidade e evidentemente, tornarmo-nos mais competitivos, porque eles são e ainda por cima, estão perigosamente mais perto que nós da terra onde se samba e do local onde se rodam filmes de cowboys...